quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Itaubal do Piririm

As curvas do rio contornam os campos alagados no período das cheias. Em contraste com o verde dos campos alagados, podemos ver vez ou outra uma garça ou outras espécies da fauna local.

A vegetação é abundante e rica em espécies.

A vegetação aquática flutuante ornamenta o rio.

Um mergulho nas águas mornas do rio Piririm nos faz suportar o forte sol.

O município de Itaubal fica há aproximadamente 2h de carro a partir de Macapá, seguindo pela AP 070 ( Curiaú ). Até a ponte do rio Pedreira a rodovia está em excelente estado, o problema é depois quando o asfalto acaba e a poeira começa. :-((  Mas o banho no rio e a paisagem compensam muito ...
Durante o trajeto, atravessamos dois rios: Pedreira e Macacoari. Vale a pena dar uma parada para um mergulho. No pequeno cais em frente a cidade não há nenhuma abrigo contra o sol, salvo a sombra de algumas árvores. Então se você não tiver a casa de parentes ou amigos é bom levar umas cadeiras de alumínio pra sentar debaixo das árvores para um descanso.


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O CABOCLO - Amapaisagens, 1992 - Hélio Pennafort

O caboclo é capaz de remar horas a fio pela sinuosidade dos igarapés sem parar o remo, nem quando pega um remanso a favor.

O caboclo é inteligente a ponto de saber o momento certo de zagaiar o tucunaré, valendo-se, apenas, do rebujo do lago.

O caboclo é suficientemente sagaz para descobrira posiçãodo caranguejo escondido no lamaçal e defender a mão do aperto das unhas do bicho.

O caboclo é competente para dirigir uma embarcação nas agitadas marés da costa Norte, em plena escuridão, sem precisar de bússolas, ecobatímetros e radares.

O caboclo é mestre na estrovação do anzol e na preparação da malhadeira, instrumentos que facilitam a sobrevivência na beira dos rios.

O caboclo é exímio dançarino e tem resistência para ficar rodopiando com a dama a noite toda, num salão de paxiúba.

O caboclo arma seu matapí com uma paciência fora do comum e, quando coloca a última tala, ainda abre aquele sorriso que é só felicidade.

O caboclo sabe distinguir o olho da paca, do veado, da onça, e qualquer bicho, quando se aventura em caçadas noturnas nas grimpas solitárias dos pequenos riachos.

O caboclo sabe dedilhar viola, cantar seresta e dizer à cabocla amada que "a última vez que eu te beijei, me alembro claramente que era noite de luar".

O caboclo é bom de porrada, e o seu jeito de brigar ainda é aquele de meter a cabeça nas pernas do cara e jogar o corpo para cima.

O caboclo é humano, pacífico e explode de carinhos, ao entalar uma asa quebrada do jacamim de estimação.

O caboclo é respeitador e, se mexer com a moça alheia, casa logo.

O caboclo é bom de cana, nem cospe, e ainda lambe os beiços depois de empurrar meiota pelo gargalo de uma só vez.

O caboclo é crente, acostumado a rezar, e tufa o peito de fé quando aconselha na ladaínha do padroeiro que "um rosário de Maria / quem rezar com devoção / não morre sem sacramento / nem também sem confissão / assim disse Jesus Cristo / quando encontrou com Adão".

O caboclo é esperto e, se está perdido no mato, bate no tronco da sapopema para ser achado.

O caboclo tem um jeito próprio de assoviar que chama o vento, quando a calmaria no litoral não empurra sua pesqueira para a frente.

O caboclo é objetivo e se vê alguém bestando com uma mulher é capaz de dar como conselho um ..."trepa logo!".

O caboclo é apegado a tudo quanto é crendice e superstição e sempre se deu bem com isso.

O caboclo é arteiro. Acende um cigarro porronca no meio da ventania fazendo uma concha protetora com a mão esquerda, metendo o palito por baixo.

O caboclo tem pronúncia própria e, no embaralhamento sonoro das letras, troca o coeficiente pelo cueficiente.

O caboclo arma poesias sempre enaltecendo suas coisas, como a "cabeça da gurijuba / que é bom pra chuchu / mocotó de caranguejo / este antão abafu / e o trapiche da Vigia / bão! este que não é pitiú".

O caboclo é pávulo e, quando sai de uma festa, gosta de ver sua camisa branca suja de batom vermelho.

O caboclo não tem nada de besta e sabe que o que a mulher gosta, mesmo, é de muito caquiado, no embalar da rede.

O caboclo faz parte da Amazônia. Como o açaí, o boto, o tucunaré e a cobra grande.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

TURISTICANDO ECOLOGICAMENTE - Amapaisagens, 1992 - Hélio Pennafort -

Maripá - Estávamos em dúvida se o camping seria na parte de baixo ou na parte de cima da cachoeira do Grand Roche. Na parte de baixo, tinha a vantagem das praias e da Ilha dos Namorados. Mas, na parte de cima, podia-se apreciar o belo visual do rio com a agitação natural das águas, quando estão prestes a destrambelhar por essa grande pedra, que atravessa o Oiapoque de margem a margem. Resolvemos, então, dividir o tempo. Metade em riba e metade em baixo. Estávamos em território da Guiana Francesa, mas podíamos enxergar a vila de Clevelândia do Norte. Tudo perto, portanto.

Decidida a divisão das horas de lazer, pegamos um trole que os franceses instalaram alí para transportar as canoas que demandam o Camopi e outros lugarejos do alto-Oiapoque porque a maior parte do ano, quando chove muito e o aguaceiro cresce, é impossível conduzí-la pelas pancadas do Grand Roche. A turbulência oferece algum perigo. E ninguém quer se arriscar.

O trole é empurrado por tacarrís, aquelas varas compridas que se usa também para empurrar canoas em campos alagados. Pode levar até seis pessoas quando não transporta nenhuma embarcação. E corre sobre trilhos que parecem centenários. Por esse caminho, a distância que separa os dois lados da cachoeira é de apenas dois quilômetros. Gostosos de se percorrer. A vegetação é abundante, como em toda margem do Oiapoque. E, apesar do lugar ser constantemente visitado, não é difícil encontrar pelo caminho alguma cotia desavisada ou solitários jacamins literalmente matutando.

Ninguém tinha pressa. Por isso, ficamos esperando quase meia-hora na metade do caminho enquanto o afoito Marcelo arrancava dois palmitos de açaí, imaginem para quê! Para tirar gosto da cachaça, cuja primeira garrafa já estava pelo meio. Conheço tira-gostos de muitos tipos e sabores, mas nunca havia me passado pela cabeça misturar cachaça com palmito cru.

Uma ladeira de pouca inclinação indicava a proximidade do rio, todo mundo desceu porque o trole é freado manualmente e muito peso pode fazer com que ele desembeste. Colocando o tacarri entre a roda da frente e a estrutura do veículo, fomos andando devagar até alcançar a beira do rio.

Tinha-se, alí, uma visão do Oiapoque completamente diferente da parte de baixo da cachoeira. O rio ficava mais estreito e em consequência adquiria uma correnteza incrível. Era necessário se esperar, por exemplo, que o motor funcionasse primeiro para poder desatracar a embarcação. Do contrário, ela poderia ser levada para a cachoeira e aí a coisa complicaria. Vale dizer que Grand Roche é uma das mais respeitáveis cachoeiras do Oiapoque. As outras relativamente próximas, são Papacoarrá, Cachiri e Couleve, em português, sucuriju. Na força do verão, o trole fica desativado. É que a cachoeira perde muito de sua força e as canoas podem ser passadas pelo Iarracuá, num remanso que a maré baixa faz surgir, no lado direito.

A água estava bastante fria de forma que o calor acumulado pelo esforço de empurrar o trole foi, pouco a pouco, sumindo do corpo da gente. Não precisa dizer que curtíamos a água de bubuia olhando a corredeira do Galibi Grande, que fica logo em frente do porto do Maripá. E eis que, de repente, aparece um providencial pescador da Guiana trazendo na ubá alguns aracusrecem-capturados pela força sedativa do cunambi. Enrolando um patuá meio fora de escantilhão, propusemos ao creôlo trocar quatro "puassons" por uma "boteille de tafiá". Além de aceitar, o cara ainda ajudou a gente a assar o peixe num fogaréu feito de gravetos, com o cuidado de, antes, retirar da barriga do aracú a bola preta do cunambi.

Depois de revigorados pelo lanche, incluindo os palmitos do Marcelo, pegamos novamente o trole para gastar o resto do dia na parte de baixo da Grand Roche.

O local era bem mais amplo e possuía, belas praias cercadas de denso arvoredo. Bem perto, a Ilha dos Namorados. Pequenina, com mato ralo e areia fina pela beira. Leva esse nome porque homizia casais desgarrados quando o piquenique tem muita gente. Pode-se alcançá-la nadando mesmo.

O banho saideiro levou quase duas horas. É que o lugar prende não apenas pela beleza que oferece. Mas, também, por uma indescritível sensação de tranquilidade, capaz de levar a gente ao estado de pura lassidão espiritual, aquela espécie de preguiça que dá na alma impedindo o corpo de se libertar dos afagos da natureza.

" E assim fiquemos bem feliz todo um tempão "

Trecho encachoeirado do Rio Oiapoque



Espaço do Hélio - Amapaisagens 1992 - Três Palavras -

O trabalho jornalístico que o Hélio Pennafort vem desenvolvendo é, sem dúvida, um dos fatos mais significantes para a história da Imprensa do Amapá. Conhecedor profundo do interior amapaense, Hélio Pennafort consegue facilmente captar a alma do nosso caboclo, inclusive traduzindo seus problemas e anseios menos aparentes. Não obstante as dificuldades que tem um jornalista de mostrar a informação do jeito que o fato ocorre e é, a preocupação literal de Pennafort está sendo a de registrar esse micro-mundo amazônico que a cada momento vai se fragmentando agonicamente com a penetração da tecnologia urbana, dando margem ao desaparecimento progressivo de muitos valores sócio-culturais que no passado tanta importância tinham para nossos avós ( Fernando Canto, Escritor e Jornalista )

Hélio Pennafort é um escritor de qualidades excepcionais que presta um enorme serviço ao conhecimento do mundo em questão. É um jornalista com um embalo simultâneo de sociólogo, etnólogo, historiador e poeta. É fascinante a leitura do seu livro "Estórias do Amapá", obra de preservação direta, desde o Oiapoque, em Clevelândia do Norte, até as peripécias da instalação do Território, em 1944. São páginas de comover qualquer brasileiro de sensibilidade. ( José Ubiratan Rosário - Professor de Cultura Brasileira da Universidade Federal do Pará, em artigo na "Província do Pará ).

Hélio Pennafort é uma antologia folclórica. Um estudo de antropologia. Um livro para sociólogos e frequentadores reincidentes do Bar do Abreu. ( Alcy Araújo - Jornalista, Poeta e Escritor, em artigo no "Informativo Guarany" )