segunda-feira, 17 de maio de 2010

Bairro do Laguinho

Fotos: Flávia Pennafort
Igreja São Benedito

Na Quarta-feira, enquanto eu aguardava o início da procissão para pegar os ramos da murta da casa de Dona Raimunda, conversava com uma das dançadoras de marabaixo do Laguinho, uma senhora de seus sessenta e poucos anos que no decorrer do diálogo me disse que não dançaria muito aquela noite, pois o corpo da professora assassinada ( Carolina Passos ) ainda estava para ser levado para a cidade natal da família.

Sede do São José

A senhora com a qual conversava não conhecia Carolina Passos, mas foi criada dentro de uma tradição de respeito extremo ao momento doloroso pelo qual a família da professora estava passando. Fui tomada por uma estranha sensação de estar fazendo algo errado ou no mínimo desrespeitoso, pois embora também estivesse abalada com a tragédia ocorrida eu estava ali ansiosa a espera do início do marabaixo.

Sede da "Escola de Samba Boêmios do Laguinho"

Mas no bairro do Laguinho é assim mesmo, convivemos com uma forte herança cultural que nos prega certas peças com relação ao comportamento.


Sede dos Escoteiros "Veiga Cabral"

No “circuito” em que eu me criei: Odilardo Silva, Nações Unidas, Eliézer Levi, General Osório, na época de minha infância as ruas ainda não estavam totalmente abertas, a vegetação tomava conta dos caminhos e a paisagem era de lagos cercados por buritizeiros e açaizeiros. Em frente a minha casa tinha um desses lagos totalmente fechado pelas palmeiras de onde os garotos iam tirar a fibra do buritizeiro para fazer brinquedos tipo carrinhos, barcos... Mas o que eles mais gostavam de fazer lá era balar passarinhos. Como o meu “circuito” era pouco habitado e não passava carros nós podíamos ouvir o barulho que as pedras lançadas faziam nas folhas das palmeiras. Pra ir até a casa de minha avó materna, que morava e até hoje mora na rua Eliézer Levi, tínhamos três opções: pela Avenida Nações Unidas ( hoje Av. José Tupinambá ), mas este era considerado muito “longe” para os padrões da época ou dois “caminhos” mais curtos, o primeiro era subir pela rua General Osório e o segundo pela Ana Nery. Em ambos tínhamos que atravessar lagos por cima de pontes improvisadas a partir do tronco dos buritizeiros. Haja equilíbrio! O ruim era quando as “pontes” apodreciam e tinha um gaiato que substuia os troncos de buritizeiros pelos de açaizeiros. Aí não tinha jeito, tínhamos que voltar e tomar a Nações Unidas. ( e eu não querendo revelar a minha idade no perfil!!! )

Poço do Mato

Como passei a infância toda como filha única eu tinha que ir pra casa da minha vó para brincar com meu tio que era só dois anos mais velho que eu. O problema é que as brincadeiras dele eram de meninos: papagaio, peteca, caroço, etc. E foi assim que passei boa parte da infância: enrolando linha de papagaio para ele quando participávamos dos “laços” no campo do América, coletando caroço de tucumã para jogar “triângulo”, do qual tenho orgulho de dizer que era melhor que muito menino; suplicando pra minha mãe comprar petecas, me escondendo dentro de casa quando os garotos irritavam o Budego ( ou Bodego ), que pelo seu modo de vida, gestos, ou maneira de andar e falar delicados certamente foi de encontro aos costumes da época; ou gritando “Ei, Camarão Friiiiiiiito!!!” para o “Camarão Frito”, pipoqueiro que passava todas as tardes pela Eliézer Levi sob um sol escaldante fazendo com que sua pele branca sofresse as queimaduras que deram origem ao seu apelido. Nunca compramos pipoca dele, pois diziam que era ruim, mas a realidade é que dificilmente tínhamos dinheiro para esses pequenos prazeres. Versão laguinense para "A Raposa e as Uvas".

Banco da Amizade

Todas as tardes íamos comprar pão na “Dona Maria do Seu Calá”. Seu Calá era o sapateiro cuja oficina ficava na Ana Nery, próximo ao campo do América, a família dele tinha também uma pequena mercearia da qual Dona Maria tomava conta. Eu não gostava de ir comprar pão com meu tio pois ele falava: “quero três pão e meio e duas donzelas". Naquela época pegava mal aplicar a devida concordância gramatical, soava meio pávulo. Eu só ia mesmo porque uma das donzelas era minha e eu devia fazer com que ela chegasse inteira ao destino.

Do que mais tenho doces recordações são dos domingos ensolarados na piscina da Sede dos Escoteiros "Veiga Cabral" e dos arraiais das festividades em louvor a São Benedito, padroeiro do bairro, que se davam na quadra da Igreja. Lá brincávamos nas barquinhas, jogávamos argolinhas para pegar maçãs, puxávamos um minúsculo cavalinho de plástico nas pescarias, e para encerrar a noite em grande estilo desfrutávamos de bolo e guaraná.

Escola Azevedo Costa

Durante as comemorações dos 65 anos do bairro do Laguinho é impossível fugir da nostalgia ao lembrar dessses tempos, que comparados ao atual podem ser considerados como “difíceis”. Eu prefiro chamá-los de “diferentes”.

Praça Chico Noé

4 comentários:

  1. oi tudo bom? me chamo João Ataíde, sou da banda afroritmo que tem em suas musicas a valorização de tudo o que você tem amor. te parabenizo pela iniciativa. quanto ao seu pai sem palavras, eu fiz um semestre de jornalismo no SEAMA e é imprecionante que cinco em cada dez fala do seu pai como referência, isso é lindo,

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  2. Prezado João, obrigada pela visita e pelo carinho com relação ao meu pai. Pode ter certeza que sou sua fã e que vamos nos encontrar nos campos aterrados do Laguinho.
    beijão
    Hélida

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  3. OI Hélida também eu era muito fã do seu pai Hélio Pennafort um excelente jornalista amigo do meu querido pai também jornalista Carlos Cordeiro Gomes os bons estão indo embora mas um dia irei encontrá-los.Tudo de bom.
    Meu blog:www.eduardo.fluminense.zip.net
    Msn:carlos.edupinheiro@hotmail.com
    orkut:eduardo fluminense.

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  4. Olá, Eduardo. Muito obrigada pela visita.
    Apareça sempre.
    Saudação bicolores
    Hélida

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