segunda-feira, 5 de abril de 2010

O Povo Daqui - PARTE VI - cont. Alimentação - Ribeirinhos


Com uma simpática e extrovertida mazaganense fechamos mais uma parte do “Povo Daqui” no que se refere aos hábitos alimentares dos habitantes riberinhos.


Casa ribeirinha, cercada pela vegetação -  rio Mazagão Novo

Os ribeirinhos ocupam um papel especial para nós pois o acesso até eles requer mais disponibilidade de tempo e reverências às tábuas das marés. Além do fato de que, como expliquei anteriormente, as casas ficam longe uma das outras, dificultando assim um apanhado coletivo.


Dona Maria Saudalice tem três hortas suspensas
com mudas e plantas medicinais.


Mas para Dona Maria Saudalice de Lima Moraes, 69 anos, pescadora aposentada, moradora das margens do Rio Mazagão Novo, ou Anauerapucu ou ainda Beija Flor, nada é complicado, pelo menos é o que sentimos ao conversarmos com ela que, orgulhosamente me mostrou suas mudinhas de plantas. Dona Maria e seu marido moram em uma pequena casa junto com um dos filhos, a nora e dois netos.

Uma das três hortas suspensas de Dona Maria

Sua casa é cercada por uma diversificada vegetação: açaizeiros, bacabeiras, mangueiras, cupuaçuzeiros, abacateiros, coqueiros, pupunheiras, goiabeiras, limeiras, tangerineiras, são as árvores frutíferas que eu cataloguei. Para temperos, ela cultiva urucum, cebolinha e pimentinha. A partir do urucum ela obtem uma fonte de renda extra, dona Maria faz o vinho para vender. A receita é simples: ela retira a casca e os caroços, amassa a polpa com um pouco de água e tempera com sal. Para cada paneiro de urucum ela acrescenta meio quilo de sal. Prontinho: sabor e cor garantidos no cardápio.


Urucum: ou urucu ( do tupi: uru-ku : vermelho ) - bixaceas

A família vende o tempero no porto de sua propriedade e tem freguesia garantida. O mesmo acontece com o açaí e a bacaba, quando chega a safra desses.


Quando se refere a plantas cultivadas para fins medicinais, Dona Maria é invejavelmente eclética: arruda, babosa, hortelã, hortelanzinho, sacaca, cibalena, manjerona, manjeroninha, oriza, cravo, entre outros são caprichosamente cultivados em sua horta.


Babosa, arruda, cravo, hortelã, hortelanzinho,cibalena,
manjerona, manjeroninha....

O chá da cibalena alivia dor de cabeça e baixa a febre. Três ou quatro folhas de hortelã em uma xícara de água quente faz-se um chá para combater infecção urinária. Chá da oriza para dores em geral, a sacaca para os males do fígado, o chá do cravo ajuda na recuperação dos movimentos para quem sofre de reumatismo ou teve derrame... e assim vai...


A família tem criação de galinhas, patos, porcos. E a pesca provê boa parte do cardápio da família: camarão, sardinha, aracu, pescada, entre outros. Embora Dona Maria seja pescadora de profissão, esta tarefa atualmente está a cargo do marido, do filho e da nora. Estes se valem de malhadeiras tanto para a captura dos camarões quanto para os peixes, embora as varas e anzóis de pesca também sejam utilizados.



Pai e filho montam a malhadeira em lugares estratégicos
no rio, horas depois vão buscar os peixes que ficam presos.
Não podem demorar muito pois os botos sempre aparecem
 para comer os peixes capturados.


Conhecer esta mulher me fez acreditar mais no ser humano. Dona Maria vive cercada de açaizeiros, não tem televisão, mora longe de influências modernas nos campos da tecnologia, educação, política, o que seja. Não tem idéia dos danos feitos à camada de ozônio ou de como avança o desmatamento na Amazônia. Ela e sua família sempre viveram nas margens do rio Mazagão Novo cercada de toda a exuberância da floresta. Ela também desconhece de que vive em uma das regiões mais bem preservadas do Brasil e do mundo. Mas nada disso impediu que ela tenha desenvolvido um dever natural para com o reflorestamento. Na foto, suas mudas de açaí que são cuidadosamente tratadas até ficarem “taludinhas”, só então elas são colocadas na terra firme.

Máquina manual de amassar açaí, licor de urucum e peneira para amassar a bacaba.

2 comentários:

  1. Oi, minha linda, amada e maravilhosa amiga. Gostei muito, muito mesmo do seu blog. As informaçoes são curtas, objetivas, claras e úteis, e dá uma verdadeira lição de Amazônia, e do dia-a-dia do universo caboclo, com seus conhecimentos. Adoro ler coisas suas, com este estilo tão lindo, claro, puro. Já me adicionei como seu seguidor. Párabéns. Estou sempre à sua disposição. Beijo do amigo.

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  2. Obrigada, Edgar. Muita gentileza da sua parte.
    Beijão
    Hélida

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